Esse é o segundo capítulo desse projeto e foi o mais bem recebido pelo público em alguns sites pela net. A história se passa no Amapá, lugar em que vivi. A lenda me foi contada por uma senhora quando eu estava viajando pelo interior do estado. Espero que gostem e como sempre peço... Critiquem! Obrigado!
Os porcos de
Mazagão.
Santarém, Pará, 07 de março
de 2007.
Após a publicação da notícia
da morte do senhor José da Silva Chucre, vários e-mails chegaram à redação de
nossa gazeta requerendo cópias do texto original encontrado junto ao corpo,
assim como, outros de caráter ofensivo e reprovador, algo que este jornalista
já esperava, mas o que mais nos causou espanto foi uma mensagem enviada pelo
senhor Carlos Prado Góes, 58 anos, morador de Macapá no estado do Amapá. O
senhor Góes nos enviou documentos da década de sessenta que seu pai, o senhor
Janari Góes tinha entre seus pertences. O pai do senhor Góes foi durante vinte
e dois anos, chefe de segurança da empresa mineradora Icomi e por toda a vida
manteve esses documentos guardados. Segundo esses mesmos documentos, um caso
semelhante ao descrito no texto do falecido senhor Chucre, ocorreu no interior
do Amapá na localidade de Mazagão Velho. Onde um jornalista foi supostamente
morto por criaturas do folclore local, o senhor Paulo Vasconcelos, desaparecido
no ano de 1967 em viagem de trabalho.
Novamente, reproduzimos o
texto, mas dessa feita, no original, para apreciação de nossos leitores, assim
como, foto tirada pela vítima, das supostas criaturas:
Eles estão lá fora cercando
a casa. Arranhando as paredes, farejando, procurando uma maneira de entrar e
dar cabo de mim.
É uma questão de tempo até
que eu enfrente o meu destino.
Para que a verdade, por mais
inverossímil que possa parecer, não fique oculta, usarei meus momentos finais
em frente à máquina de escrever que encontrei na casa, narrando todo o
ocorrido.
Meu nome é Paulo
Vasconcelos, sou por ofício, jornalista investigativo.
Há seis meses, fui
contratado por uma empresa mineradora do norte do país, para investigar o
desaparecimento de uma equipe de técnicos no interior do território do Amapá.
Saindo de São Paulo por
avião, cheguei à capital do Pará e lá tomei um navio que se dirigia para o
território federal.
Quatro dias após meu
embarque, cheguei ao porto de Santana, onde fui recebido pelo senhor Janari
Góes, chefe de segurança da empresa que havia me contratado. O senhor Góes me
entregou então, um dossiê produzido pela polícia militar acerca dos dados
preliminares coletados nas cercanias da área do desaparecimento, uma vila no
interior, chamada Mazagão Velho.
A documentação era farta,
mas, no entanto, vaga e pouco confiável. Consistia em sua maioria de
testemunhos e fotos de cidadãos da localidade, que tinham em comum o fato de
que os desaparecimentos eram atribuídos a criaturas do folclore local, na época
tomei tudo por crendices dos caboclos do lugar.
Após uma longa e penosa
viagem por estradas de terra, quase intrafegáveis graças às pesadas chuvas
equatoriais da região, acabei por chegar à vila de Mazagão Velho. Um lugar
perdido no tempo, com cerca de 230 famílias, que tinha como a principal
ocupação produtiva a agricultura. Não havia hotéis, então fui hospedado na casa
de um antigo funcionário da mineradora, caboclo idoso que foi aposentado devido
a um acidente de trabalho. Seu nome era Manoel da Silva Borges, homem simples e
muito religioso, que me acolheu como a um filho em sua casa.
Por semanas minhas
investigações não geraram quaisquer informações que divergissem das previamente
recolhidas no dossiê. Na verdade, a população local se mostrou arredia, me
evitando ao máximo. Segundo meu hospedeiro, a comunidade seria mais solicita
com o passar do tempo, assim que eu me provasse como disse o velho, um bom
cristão. E então por semanas, passei a frequentar a paróquia local e a não
fumar e beber em público.
Meus atos geraram frutos e o
povo da localidade passou a ser mais receptivo ante as minhas averiguações e
uma nova pista acabou por surgir. Segundo alguns caçadores, provavelmente a
equipe acabou por encontrar um garimpo clandestino durante suas pesquisas na
mata e foi executada para que não denunciassem sua localização para as
autoridades militares. Seguindo essa nova linha de investigação, juntamente com
um guia local, passei algumas semanas vasculhando as matas da região. Mas meus
esforços foram infrutíferos.
Certa noite, ao voltar de
mais um dia de investigações mal sucedidas, encontrei Manoel completamente
bêbado, ele estava sério e soturno, falando sozinho. Ao ver-me chegar, ofereceu
um copo de bebida, uma emulsão de cachaça, canela e gengibre, demasiado forte e
aromática, e começou a narrar como sua esposa e filho haviam sidos levados
pelas supostas criaturas que os cidadãos da vila tanto mencionavam em suas narrativas.
Na oportunidade, senti pena do pobre velho solitário e não lhe dei crédito
algum.
Decorridos cinco meses sem
conseguir nenhuma nova informação quanto ao paradeiro da equipe desaparecida,
contatei a mineradora e dei por encerrada a investigação.
Antes de voltar para São
Paulo, decidi que seria interessante escrever um artigo sobre o folclore local,
para tanto, procurei averiguar a origem do mito. Preliminarmente não obtive
sucesso, pois os caboclos não possuíam essa informação, mas não tardou até que
eu descobrisse que o padre da paróquia local era um entusiasta da história e
folclore da região. O padre Moretti foi muito solícito e emprestou-me suas
notas pessoais sobre o tema para meu uso. Munido dessas novas informações, pude
saber que a origem do mito remontava a uma tribo que habitou a região no
passado e que o mesmo fora absorvido pelos caboclos, recebendo tons de
violência extrema e ainda, da localização de um sitio arqueológico onde as
criaturas foram supostamente por vezes avistadas. O padre também me permitiu
fotografar alguns desenhos feitos por cidadãos da vila que supostamente haviam
encontrado os seres descritos no mito. Os desenhos tinham um aspecto
perturbador em comum, todos representavam seres hominídeos com feições de
porcos, algo semelhante com iluminuras medievais de demônios da mítica
católica.
Procurando
me munir de algumas fotos do local dos supostos avistamentos, procurei o
auxílio de guias locais, no entanto nenhum deles aceitou a incumbência, não
importando o quanto lhes fosse oferecido, dado isso, entrei na mata acompanhado
apenas de uma câmera fotográfica e um revólver.
Vaguei pela
mata em trilhas incertas e cansativas durante horas, mas por fim, encontrei o
lugar. Em uma clareira, várias lajes de rocha negra estavam dispostas em
círculos e a julgar pelo seu aspecto, deviam ter milhares de anos. Por meia
hora, tirei fotos do lugar até ouvir sons na mata, parecia algo semelhante a
passos humanos e guinchos de algum tipo de animal, o que me causou um profundo
desconforto. Instintivamente saquei de minha arma e comecei a caminhada de
volta a vila, ouvindo durante todo o trajeto os sons a minha volta. Somente no
começo da noite alcancei meu destino e só então me senti seguro. Quando cheguei
à casa de Manoel, contei o ocorrido ao caboclo e ele me pareceu preocupado.
Pela manhã,
ao acordar, não encontrei o meu hospedeiro em casa, estranhei esse fato, mas
ainda assim comecei a me preparar para partir. Apenas pelo fim da tarde que o
velho voltou, ele estava acompanhado de um rapaz chamado Sabino. Ambos me
informaram que objetos da equipe de pesquisas haviam sido encontrados em uma
casa localizada em certa ilhota e caso eu ainda tivesse interesse, poderia ser
levado pelo jovem até lá. Prontamente eu aceitei a proposta e levando minha
arma e câmera, parti para o lugar. Deixei com Manoel o rolo de filme que havia
usado no dia anterior, para que fosse enviado pelo correio até a capital a fim
de ser revelado. Ao se despedir de mim, o velho pareceu triste e envergonhado,
não me olhando nos olhos em qualquer momento que fosse.
O garoto e
eu embarcamos em uma pequena canoa e juntos remamos até uma ilha em um braço
distante de rio. Chegando lá, Sabino me guiou pelo lugar, onde finalmente
avistei a casa na qual foram encontrados os objetos. Era toda feita de madeira,
parecia ter sido recentemente construída e ser muito sólida, estranhamente não havia
janela alguma, apenas a porta de entrada. Ao entrar, encontrei uma série de
documentos e equipamentos diversos pertencentes aos desaparecidos. Permaneci no
lugar lendo os documentos a procura de pistas até o cair da noite. Já com a lua
alta no céu, o garoto disse que iria até a canoa buscar um par de redes que
usaríamos para pernoitar no local, já que navegar na escuridão seria perigoso e
então partiu, deixando-me só. O rapaz demorou a voltar e preocupado com sua
segurança, dirigi-me até o lugar onde a canoa havia sido atracada e para meu
assombro, não encontrei a ambos. Novamente um estranho desconforto se insinuou
e correndo, voltei para a casa e a tranquei completamente.
Por volta
da meia noite, ouvi mais uma vez os sons que ouvira próximo as placas de rocha,
só que dessa vez, pareciam ser criados por um grande bando de animais ou
pessoas. De arma e lampião em punho, esse encontrado entre os objetos contidos
na casa, sai para verificar o que estava produzindo os sons. Durante minutos,
nada surgiu e mesmo os sons se silenciaram, até que o horror se mostrou.
Lentamente uma figura baixa saiu da mata que cercava a casa. Um ser disforme,
coberto de pelos grossos e imundos, grotescamente obeso e com feições de suíno
se pôs ante mim. Dominado pelo medo, esvaziei o tambor do revólver contra a
criatura. Ela guinchou e pesadamente caiu no chão, morta. Por segundos o
silêncio dominou o lugar, até que novos guinchos irromperam da mata e uma
dezena de outras criaturas começou a surgir da floresta escura correndo em
minha direção. Imediatamente tranquei-me na casa, colocando uma pesada tranca
de madeira contra a porta, o que por hora, tem as mantido do lado de fora.
Ainda tenho
doze munições comigo, mas sei que não serão suficientes para me salvar.
Imagino ter
sido colocado aqui como uma espécie de sacrifício para as criaturas pelo povo
local, por ter chegado perto demais da horrenda ver...
Foto: O homem-porco
espreitando.
Na foto,
uma formação paleolítica de dolmens de rocha negra, cobertas de grafismos
rupestres e musgos no meio de uma densa floresta equatorial. No canto esquerdo
da mesma, pode se ver entre a vegetação, uma criatura diminuta, de aspecto maldoso,
semelhante a um porco com corpo humano, a espreitar.
Segundo os
dados encontrados em documentos que atestam a contratação do senhor Vasconcelos
pela citada empresa mineradora, os eventos descritos no texto teriam presumivelmente
ocorrido entre janeiro e julho de 1967.
Poucas
informações foram conseguidas acerca do mito citado no texto, todas elas
diferem entre maldições, licantropia e uma raça de criaturas monstruosas. Tendo
em conta tal fato, pedimos aos nossos caros leitores, que por ventura possuam
dados aprofundados sobre o mesmo, que nos os enviem para que possamos os
publicar aqui.
Quanto aos
dolmens descritos na narrativa, eles realmente podem ser encontrados no norte
do estado do Amapá, no Sítio José Antônio, que se situa próximo ao curso do rio
Cunani. Nesse sítio ainda se encontram um conjunto de 150 blocos dispostos em
linha dupla que acompanha o traçado do rio Calçoene. Segundo o arqueólogo Curt
Nimuendaju, essa formação teria uma função religiosa.
Novamente
nos colocamos à disposição dos leitores, para assim que requerido, enviarmos de
pronto, os arquivos digitalizados dos documentos originais em nossa posse, para
a apreciação quanto sua veracidade.
C. C. de Carvalho. –
Repórter
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